terça-feira, 19 de maio de 2009

A minha avó vive nos Montes da Senhora uma freguesia pertencente ao concelho de Proença-a-Nova, distrito de Castelo Branco, conhecida pelas suas cerejas. Nos anos 60, as coisas eram muito diferentes daquilo que são hoje.
Antigamente, só se entrava para a escola aos 7 anos de idade e, normalmente, só os rapazes é que faziam o exame da 4ª classe, terminando por aí os estudos, pois não existiam perto estabelecimentos de ensino que permitissem prosseguir estudos, para além das dificuldades dos transportes, que não eram tão frequentes como hoje em dia. Eram raros os casos de estudantes que tiravam um curso. Mesmo para irem à escola primária, os alunos das localidades mais distantes caminhavam 5 e 6 Km a pé. Os pais só se interessavam que os rapazes fossem estudar, pois as raparigas, desde que fizessem a 3ª classe, saíam da escola e iam aprender costura, a fazer a vida de casa, pois tinham que ajudar as suas mães, as quais passavam grande parte do dia no campo.
A educação familiar também era muito diferente. Os filhos “respeitavam” mais os pais e sobretudo os mais velhos.
A electricidade só chegou em 1968. Como podemos imaginar, não havia televisão, frigoríficos ou outros electrodomésticos que hoje são muito importante nas nossas vidas.
Trabalhava-se muito à luz das candeias a azeite e dos candeeiros a petróleo. Era à sua luz que as raparigas faziam os seus enxovais, praticamente só à noite, aos serões. Umas fiavam, outras bordavam, enquanto outras faziam renda e assim se passavam as grandes noites de inverno.
Nos domingos à tarde, os jovens juntavam-se no adro da igreja e faziam bailaricos.
Os transportes eram rudimentares. Andava-se sobretudo a pé. Quando necessário, usavam-se carroças puxadas por animais, para transportar mercadorias ou pessoas. As vias de comunicação também eram muito deficientes: caminho de terra batida em que dificilmente se conseguia andar devido ao pó e à lama. Só mais tarde surgiram os primeiros transportes colectivos: um carro de aluguer e o autocarro, que se deslocava à povoação uma vez por semana. As pessoas viajavam só em caso de necessidade absoluta.
O correio era transportado em sacos apropriados, por mulheres que iam ao encontro da camioneta. Tinham de percorrer cerca de 3 Km. Entregavam um saco com a correspondência enviada e recebiam outro com a recebida. Quando regressavam à localidade, era entregue numa casa determinada, onde as pessoas a iam buscar. Não havia distribuição ao domicílio. Nessa altura, havia poucas pessoas a saber ler e escrever e por isso a correspondência era pouca. Só mais tarde, com a intensificação da emigração para África e Europa, é que começou a haver mais correspondência. As pessoas que sabiam ler e escrever é que liam e escreviam as cartas das outras pessoas, inclusive para os namorados.
Nesse tempo, também não havia telefone na localidade. Só mais tarde é que veio o telefone público e alguns particulares também puseram o telefone. Para telefonar, era preciso tentar várias vezes e, por vezes, para fazer a ligação, eram necessárias horas, porque era tudo manual e a chamada tinha de passar por várias centrais que iam estabelecendo a ligação.
Outra grande diferença para os dias de hoje eram as condições habitacionais. O único aquecimento que havia era a lareira, que também servia para cozinhar os alimentos, pois não havia fogões a gás e muito menos eléctricos. Naquele tempo, não havia casas de banho e nem sequer havia água canalizada. Íamos buscar água às fontes, que eram de mergulho, ou aos poços. A água era transportada à cabeça e, muitas vezes, no caminho da fonte é que se namorava. As casas tinham as divisões mais pequenas que hoje.
O vestuário também era em menor quantidade. Havia a roupa do trabalho e a de sair, que era vestida principalmente aos domingos. Como não havia máquinas de lavar nem água canalizada, era no ribeiro que se lavava.
A alimentação também não era tão variada como hoje. De manhã, comiam-se sopas de café com leite, sobretudo de cabra. Não havia manteiga, cereais, nem outros alimentos como hoje. Para além do almoço e da merenda, havia também a ceia, ao anoitecer. Comiam-se sobretudo alimentos provenientes da agricultura. Matava-se também um porcom que alimentava a família durante o ano inteiro. Os presuntos e o toucinho eram guardados na salgadeira e os enchidos, depois de fumados, no azeite. Raramente havia peixe. Por vezes havia bacalhau e conservas.
Os irmãos mais pequenos ficavam ao cuidado dos irmãos um pouco mais velhos, de alguma vizinha ou de algum idoso que não pudesse trabalhar, pois todos os que podiam trabalhar tinham que ir para o campo, pois havia sempre que fazer.


Eu e a minha avó

João Cunha